quarta-feira, 5 de junho de 2013

Se Barroso fosse mulher

Luís Roberto Barroso foi indicado a ministro do STF. Nós sabemos sua linha de pensamento, sabemos a faculdade onde estudou. Sabemos sua opinião sobre o aborto, sobre o casamento gay. Sabemos as causas em que atuou, as matérias que leciona, os livros que escreveu. Não faço ideia se ele é casado, divorciado ou solteiro, se tem filhos, ou a grife do seu terno.
Se Barroso fosse mulher, o cenário provavelmente seria diferente.
Se Barroso fosse mulher, o noticiário anunciaria que ela é mãe de dois filhos e tem um netinho lindo de três anos. Se Barroso fosse mulher, apresentadoras de programas matinais questionariam seu penteado e se perguntariam porque usou terninho de calça, e não de saia. Se Barroso fosse mulher, "revistas femininas" a entrevistariam perguntando como consegue conciliar sua vida pessoal de mãe e esposa com tamanha responsabilidade jurídica. Se Barroso fosse mulher, haveria reportagens "bombásticas" sobre a plástica no nariz que fez três anos atrás, perguntariam se seu terninho é Prada ou Chanel, e olhariam a sola pra ver se seu scarpin é Louboutin. Se Barroso fosse mulher, saberíamos que ela chegou a ser Miss Sergipe na juventude, mas resolveu dedicar-se inteiramente ao Direito. Se Barroso fosse mulher, saberíamos que ela já foi casada com um famoso executivo, e teve uma filha dessa união. Se Barroso fosse mulher, saberíamos que ela não tem tempo para cozinhar, mas às vezes, num domingo especial, faz um salmão com alcaparras divino. Saberíamos que ela faz ginástica três vezes por semana, e que seu cabelo não tem nenhum segredo a não ser luzes discretas e uma hidratação semanal.
Se Barroso fosse mulher e Dilma fosse homem, talvez a cumprimentasse elogiando como ela está bonita ou este vestido lhe assenta bem, pra quebrar o gelo.
Seria assim, se Barroso fosse mulher.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Abre as asas sobre nós

Creio eu que deveria dizer que detesto carnaval, que tenho horror declarado à música ruim, ao calor, ao suor, às aglomerações; que o carnaval é uma festa fútil, infantilizada. Mas a verdade é que eu adoro o carnaval. Porque o carnaval mesmo, o espírito do carnaval, o "carnavalgeist" é maior que o axé music, que os abadás, que as praias lotadas. O carnaval é a materialização de uma liberdade impensada em dias comuns.
Para mim, não há nada mais animador que saber que, se estiver a fim, posso acordar e ir vestida de Cleópatra à padaria, e ninguém vai nem ligar. As pessoas exercitam a liberdade sem medo, e ocupam as ruas, as praças, sabendo que se quiserem podem ir fantasiadas, e se quiserem podem também não ir. O carnaval subverte, o carnaval liberta. Se homem quer vestir-se de mulher, ou vice-versa, se criança quer sair de adulto, se adulto quer andar como criança, a ninguém importa e diz respeito. Cada um com sua consciência e suas vontades. Isso para mim é revolucionário, é inovador.
O carnaval é tão livre, mas tão livre, que até às pessoas que não gostam dele, liberta. Elas podem orgulhosas dizer que não suportam a balbúrdia e partir para locais tranquilos, de lareira, friozinho e jazz. Enquanto isso os partidários do carnaval também não se importam: partem para as noites bárbaras e acesas, talvez agradecendo no íntimo a quem vai embora e deixa mais espaço na rua.
Carnaval para mim não é escola de samba, não é bloco, nem desfile: carnaval é um tempinho do ano (talvez pequeno demais, talvez por isso mais intenso) em que cada um exerce sua felicidade da forma que lhe convém. Nada mais é preciso dizer.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Toucado

Já tem um tempo [muito tempo] em que eu andei folheando umas revistas dos anos 80. Várias delas tinham reportagens sobre cabelos, e davam conselhos às leitoras de cabelos muito lisos, "ralos", com truques para deixá-los "mais volumosos e atraentes". O tempo muda mesmo. Hoje em dia há recursos sobrando e filas nos salões para fazer progressiva nos cabelos. Mas o que me chamou a atenção foi a campanha que vi no Facebook esses dias: "Em terra de chapinha, quem tem cachos é rainha."
Não vou negar que a campanha tem uma base interessante, isto é, que as mulheres lutam incessantemente desde o início dos tempos contra a natureza de seus cabelos e seus corpos para adequar-se ao padrão de beleza, e que devem se "libertar" dessa opressão. Mas, sinceramente, será que há algo de fato libertador nisso? Ao declarar as donas de madeixas aneladas como rainhas, não se está criando um novo padrão? E as mulheres de cabelos lisos naturais, vão ter que voltar aos anos 40 e usar bobes?
Libertador é usar o que te agrada. Aconteceu de eu nascer com o cabelo ondulado, mas acho que o liso fica melhor para mim e assim prefiro. E não vejo como negação do meu biótipo, de origens ou do que seja. É uma questão somente de gosto pessoal. O que importa não é buscar o ideal de beleza alheio, mas sim harmonizar ao máximo possível o que se parece com o que se deseja parecer.
A mulher é livre, tão livre que pode escolher ir contra o padrão ou a favor dele, sem ter que ser obrigada a ter a aparência com que nasceu. A mulher negra que pinta o cabelo de loiro está tão certa quando a loira que pinta de ruivo ou a morena que mantém o castanho. O que importa é que se olhem no espelho e vejam o reflexo de si mesmas. De verdade.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Óculos de Drummond

Ainda muito nova vesti os óculos de Drummond, e nunca mais os tirei da cara. Desde então, esse costume adquirido de ver o mundo por detrás de suas lentes me acompanha, e estou quase certa de que irá comigo até a morte. Carlos Drummond está comigo assim como o ar à minha volta: a todo o tempo está ali, mas ocasionalmente, de súbito, tomo ciência da sua presença ao respirá-lo. Sinto o pulso do poeta a conduzir cada palavra que escrevo. Sinto a lâmina afiada de seus versos perfurar meu peito e atingir, fulminante, o coração.
O poeta está comigo quando caminho nas ruas de pedra de Valença, minha Itabira, e quando, no Rio, paraliso de surpresa e encanto sempre que vejo o mar. O poeta está comigo na força da memória, que não deixa cair da lembrança suas palavras. O poeta está comigo quer eu veja processos ou antologias, e tudo isso vejo partindo de seus óculos.
O poeta está comigo.

"(...)Tão simples reconhecê-lo, toda identificação é vã. O poeta levanta seu copo. Levanto o meu. (...) Falando em voz baixa nos entendemos, eu de olhos cúmplices, ele com seu talismã."

Drummond, 'Quintana's Bar'.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Venda nos olhos

Outro dia eu estava indo à faculdade levando um vade mecum nos braços. Fazia o caminho habitual quando quase esbarrei em um homem dormindo na calçada. Estava diretamente no chão, profundamente adormecido, ali, em meio ao barulho dos carros, à sujeira e ao ir e vir das pessoas a seu lado. Eu olhei para aquele homem e essa imagem me pareceu irônica, quase sádica: eu, saindo de casa alimentada e vestida, levando a Lei que me assegura que aquele homem tem os mesmos direitos que eu, e ele ali no chão.
Eu passei ao lado desse senhor carregando quilos de páginas impressas com símbolos que ele provavelmente desconhecia, e que garantem que ninguém neste país pode ficar em situação semelhante. Eu iria para a sala de aula, sentar-me em suas cadeiras e ouvir sobre a igualdade, a sociedade, a justiça, e aquele homem continuaria ali, deitado no chão.
Nunca as amarras metafóricas me pareceram tão reais e tão fortes. De repente, a imagem da Justiça cega me pareceu muito mais lógica.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Alvorada


Mas pra fazer um samba com beleza
É preciso um bocado de tristeza
Precisa um bocado de tristeza
Senão não se faz um samba, não
(...)
Fazer samba não é contar piada
Quem faz samba assim não é de nada
O bom samba é uma forma de oração

Vinicius e Baden

O samba não é consolo, não senhor. O samba não é para alegrar ninguém. O samba é companhia pra quem tem dor. Eu não acredito neste samba novo, todo cheio de festas, de trocadilhos. Um samba não é para te distraíres. O samba é redenção.
Redenção, sim. Eu disse que o samba não é para alegrar, mas não disse que ele não cura a dor. Sim, porque para a dor passar, não tem saída: remédio é vivê-la. E eis a dor no samba, lírica e pura, sem ostentar tristeza pra ninguém. Uma dor bela e sem luxo, que na sua simplicidade busca somente desaparecer. Como uma lágrima.
Acho que a vida da gente devia ser assim feito o samba. Demonstrar alegria quando se está contente e tristeza quando infeliz, sem depender de motivos extraterrestres para um sentimento ou outro, reconhecendo que todo mundo vive e viverá ambos, religiosamente da mesma forma. Sim, porque o sentimento iguala a todos, e o que fez Cartola rir ou chorar ontem, é o que nos fará chorar ou rir amanhã.
E o mais importante: a plena consciência a cada alvorada de que é melhor ser alegre que ser triste, que alegria é a melhor coisa que existe. E a vida é isso aí mesmo.




Olá, gente bonita! Este Banquinho fez três anos semana passada, mas está tão novinho que ganhou até página no Facebook! Está aí o link, pra quando tiverem um tempinho https://www.facebook.com/pages/O-Banquinho/250774584961029

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Por que Quintana não se casou?




Porque nasci atrasada, ora bolas!