quinta-feira, 11 de março de 2010

Inveja

Guerra, sexo, esporte
- me dás tudo, tudo.
Vou pregar minha porta:
já não preciso do mundo.
José Paulo Paes

Quando li esses versos do José Paulo Paes pela primeira vez - assim mesmo, só esse pedaço, sem o resto do poema - fiquei absolutamente maravilhada. Agora, já me parecem comuns, reles, mas naquele momento foi quase um êxtase. Qual soneto de fidelidade, antíteses camonianas! Era a declaração de amor perfeita.
Sempre tive admiração e grande respeito pelos monges e demais penitentes que se dispunham a viver fora do mundo para se dedicarem exclusivamente à oração ou meditação. Para mim, só uma fé colossal e um amor tão grande quanto poderiam fazer alguém abandonar a vivência da carne. E - também opinião pessoal - essa fé e esse amor tão grande dispõem de uma só fonte: Deus.
E então me deparei com esses versos, em que o autor dizia simplesmente não precisar do mundo. Tratando-se de um homem, supus que a criatura iluminada que o havia inspirado era uma mulher, e não pude evitar sentir aquela pontada dolorida de inveja que eu costumo ter das musas dos grandes poetas. O fato de renunciar à vida secular por qualquer motivo não religioso era para mim a expressão do sentimento mais forte, da paixão mais apaixonada que alguém poderia ter.
Foi aí que resolvi procurar o restante do poema. E encontrei. Os queridos leitores sabem o título dele? "À televisão". Exato. Aquela devoção toda a um eletrodoméstico. Primeiro, desilusão devastadora. Depois, cheguei a sorrir com desdém, pensando na companheira do poeta. Coitada, mas que rival foi arranjar! Minha inveja esgotou-se de todo.
Meu desdém também durou pouco. Logo me peguei pensando que a sedutora tevê não existia apenas na cidade do poeta, mas também no mundo inteiro. A rival universal. E por sinal, já vitoriosa: sou física e intelectualmente incapaz de prover tudo o que uma televisão oferece. Aliás, não só eu: qualquer uma.
Acho que mudei meu conceito de amor colossal.

Aqui está o link do poema completo, para vosso deleite:http://www.imaginariopoetico.com.br/2009/06/televisao-jose-paulo-paes.html
E um ps.: Desculpem-me pelo abandono digno de teias de aranha em que deixei este blog nas últimas semanas. Foi por uma causa justa: mudei de cidade para entrar na faculdade (sim, oh! a faculdade!) e saí da faculdade e voltei para minha cidade, de onde sairei novamente para entrar em outra faculdade daqui a algumas semanas (nessa eu pretendo ficar). Por favor, não me abandonem.