sábado, 17 de abril de 2010

Lirismo

O lirismo é para mim como que um amor platônico. Acho-o lindo, belíssimo, quando o vejo passar nos trajes vistosos de um poema do Álvares de Azevedo ou do Vinícius. Acho-o atraente quando anda discreto, como quem não quer nada, em algum quarteto do Quintana. Gosto dele até quando rude e seco no sertão de Graciliano Ramos.
Flerto com o lirismo, admiro-o quando o vejo. Se acaso me dirige a palavra fico sem ar, suspiro profundamente, nunca sei o que dizer, só fico lá, abobada, olhando. Se vem tuberculoso e insano junto com Augusto, quero curá-lo. Se vem desiludido dos amores e da vida, ofereço consolo.
Mas só que o lirismo não liga pra mim.
Não importa quanto tempo eu dedique chamando, ele nunca dá o ar da graça. Recito poemas, leio prosa, ouço boa música, mas ele não vem a mim, não sei porquê. Vejo que outras pessoas - até alguns amigos meus! - convivem e escrevem com ele na maior naturalidade, como se fosse a coisa mais simples do mundo. Que inveja!
E eu também tenho medo. Temo que se eu for atrás dele, pegá-lo à força, trazê-lo para mim, ele não será autêntico. Tenho medo de que o lirismo seja falso, de que seja superficial, forçado, namorador, político, raquítico, sifilítico. Morro de medo! E o maior de todos: medo de não estar à sua altura.
Acho que o que eu preciso é me desiludir do lirismo: tomar consciência de que ele não vai querer saber de mim tão cedo, me conformar e continuar vivendo e escrevendo sem ele. Vou deixá-lo para almas mais competentes.
— Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.
Estou contigo, Bandeira!

2 comentários:

V.H. de A. Barbosa disse...

Se você amarrasse o lirismo, torturasse-o, cuspisse em sua face, ainda assim você escreveria bem, Laila.

Isadora disse...

Se você amarrasse o lirismo, torturasse-o, cuspisse em sua face, ainda assim você escreveria bem, Laila. [2]