quinta-feira, 21 de outubro de 2010

V de Justiça


Sabe, eu já fui ferrenha defensora da vingança. Aquele sentimento de "pagar na mesma moeda", ou de "dai força aos meus inimigos, para que eles possam assistir a minha vitória" dava uma satisfação pessoal, uma impressão de justiça, sei lá.
Felizmente a gente cresce, e anos depois, por motivos religiosos acabei descobrindo um outro lado da justiça: o perdão. E mais alguns anos depois cheguei à conclusão de que a vingança não só não compensa, como também só traz prejuízo ao vingador em questão. Nos casos mais famosos, cito o brilhantíssimo Edmond Dantés (o Conde de Monte Cristo) e o V (for Vendetta), tendo um pago deixando o amor de sua vida, e o outro, deixando o amor de sua vida e a própria vida.
E a cantilena eterna do "deixa debocharem de você, porque um dia você será bem sucedida e eles não" praticamente dispensa comentários. Afinal, nem sempre quem sofreu ofensas no passado será necessariamente bem sucedido no futuro, e mais ainda, pode muito bem acontecer que quem foi vil no passado acabe por ter uma vida de sucesso. Ou mesmo pode acontecer que o ofendido em questão dedique sua vida a obter todo o mérito, e o inimigo nem se lembre mais dele. O custo-benefício da vingança é claramente negativo.
Mas isso não vem ao caso.
O que mais me intriga é o porquê deste fascínio tão grande que ela exerce. Meu lado racional explica claramente que ela não serve para nada, e mesmo assim não há como deixar de lado a minha expressa preferência por Dantés e o fato de ser V um dos meus filmes favoritos.
Por quê?
Por que avozinhas que fazem bolinho de chuva e tricô querem unanimamente que a vilã da novela tenha morte dolorosa e sofrida no último capítulo? Por que as crianças - aliás, não só as crianças, mas todo mundo (só que só elas expressam), ao ver o antagonista do filme em seu fim trágico sorriem e pensam "bem feito!"? Não vejo lógica nenhuma nisso.
Seria, por acaso, algum inconsciente coletivo tarantinesco que quer empunhar uma espada ninja e escalpelar todos que já lhe fizeram mal?
Não faço ideia.
O que me vem à mente é que a humanidade ainda tem que evoluir muito, mas muito mesmo, para deixar para trás completamente o "olho por olho, dente por dente". Nós nos empenhamos - aliás, não só nos empenhamos, mas de fato o fazemos - a perdoar e esquecer, mas na hora da batalha do mocinho contra o vilão, o duelo só está completo com o último jazendo ensanguentado.
Nosso inconsciente ainda é tão primitivo quanto na época dos apedrejamentos ou da guilhotina.

14 comentários:

Edison Waetge Jr disse...

"Por que avozinhas que fazem bolinho de chuva e tricô querem unanimamente que a vilã da novela tenha morte dolorosa e sofrida no último capítulo?"

Ótima pergunta! Isso sempre me assustou na minha bisavó...

Marina disse...

Por que o povo achou o máximo quando a mulher que traía o marido, numa novela que passou, levou a maior surra dele? Eu não vi a novela e fiquei assustada com as pessoas falando com uma alegria enorme dessa cena. A lei Maria da Penha, onde fica?

A humanidade me assusta.

Isadora disse...

Todos somos primatas...

É uma honra poder ler suas palavras colega. =)

Isabela Salgado disse...

Eu creio que a máxima de “amar ao próximo” ainda está excessivamente longe de ser alcançada pelo gênero humano.Conquanto não nos for dada uma razão para amarmos o outro,não o faremos – e,se,pelo contrário,nos forem dados motivos contrários,a tendência é que nos regozijamos com a queda do antagonista.A vingança,acredito eu,ainda que não represente uma justiça imparcial,não o deixa de ser no aspecto pessoal, “humana” justamente por independer das regras sociais – e talvez daí venha toda a atração pelo ato de “fazer o outro pagar pelos erros”.Concordo que o perdão não só é ético e correto,como provavelmente superior em benefícios finais;o seu único impasse é que dificilmente alcança o prazer pessoal de “justiça”, que a vingança,por sua vez,facilmente proporciona...
Tenho que admitir que sou simpatizante da vingança – uma vingança mediada pela razão,ao menos na medida do possível.

Dantés e V são eternos.Ótimo texto,Laila,meus parabéns =]

Laila disse...

Quanta honra em ver aqui pela primeira vez a ilustre Isabela!
"vingança mediada pela razão" talvez seja um paradoxo, afinal toda vingança tem como combustível fundamental a emoção.
O rancor é o etanol da vingança!

Isabela Salgado disse...

Hey,Laila!Pois a honra aqui é a minha,de participar de seu blog =]

Em todo caso,foi por isso que mencionei "na medida do possível":eu bem reconheço que a vingança advém de motivos absolutamente emocionais,mas quando ressalvo ser ela mediada pela razão,me refiro não apenas à sua estrutura - ou seja,como ela será executada e em que escala - ,mas igualmente nas suas consequências;uma "vingança razoável" não alcançaria os extremos de uma "vingança desumana" justamente por não se deixar levar inteiramente pela emoção que a move.
Enfim,em termos gerais,eu apóio uma vingança elaborada e não excessiva,uma "vingança mediada pela razão" em termos de circunstâncias e consequências,como disse anteriormente.

Nanda Assis disse...

encantada com seu blog.

nbjosss...

M. [doc] B. disse...

Passasse? Todos me perguntam isso.

Unknown disse...

oi adorei aqui ..se puder da uma passada no meu blog ..se gosta seque lá sera bem vinda .

Unknown disse...

Amei seu Blog... muito legal...

Ótima Semana....

maria disse...

O que os outros fazem de errado não deve provocar incômodo ao ser humano. Este precisa acontecer quando ele é o praticante dos erros.
Quando não se consegue amar o outro pelo que ele é, porque ele mesmo não se deixa conhecer ou por fazê-lo demais, é preciso que se lho ame pelo que JESUS o fez: NOSSO IRMÃO.
O CRIADOR colocou-se no lugar, na mesma condição, da criatura, mas esta não consegue sequer imaginar-se na posição do semelhante, mas sempre exige que ele a compreenda e perdoe. Porém, DEUS perdoa sua ignorância.

Stephanye disse...

Laila, amei seu blog! Muito legal, os textos são ótimos, você escreve muito bem (: Também adorei o quadro com o banquinho, ele é lindo!

Confesso que me enrolei aqui, fui tentar entrar na conta do google e perdi meu comentário inteiro, hahaha

Mas como esse negócio de vingança não está com nada, resolvi perdoar e escrever tudo aqui de novo sem mágoa nenhuma :P

Eu só tinha falado que a vingança sempre parece bem atraente na hora, mas no fim não compensa, o chato é que a gente só descobre isso depois :/

Mas hoje já existem filmes nos quais o "malvado" se regenera, né, rs

Acho que o exemplo mais bonito é "Horton e o mundo dos quem", Sem querer mandar nenhum spoiler (se bem que acho que esse filme já passou na tv), posso adiantar que, além de uma mensagem linda durante a história, no final ainda tem o bônus do perdão. Eu me emociono, hahaha

Pra não correr o risco de mandar um comentário anônimo sem querer, vou me identificar por aqui também.

Sua amiga e colega de economia II, Stephanye (:

Icaro T. disse...

só uma OBS:

Acho que o Dantés ficou muito bem com aquela indiana de familia real que se casou, a mulher que ele amava não merecia ele...

e, otima abordagem, o Perdão nos cura!

Luís Freitas disse...

Sabes Laila, são poucas as pessoas que sabem perdoar, todos adoram dizer "ninguém me pisa", todos se querem gabar disso, "pisaram-me com um pé mas eu pisei com os dois", é disto que se trata, ninguém gosta de acreditar no que vou dizer, mas eu defendo que o ser é mau por natureza, onde o perdão por vezes pertence apenas aos fracos, aos que tiveram medo de reagir, é assim que por vezes é definido, embora absurdo, na nossa sociedade é a essas pessoas que esta dádiva é entregue. Somos seres fracos que retiramos prazer do mal dos outros e isso entristece-me.